sexta-feira, 28 de setembro de 2012



A VOZ DO MEU SILÊNCIO

cláudia helena villela de Andrade

A voz que me fala é breve.
Não me amanhece.
Não me alisa.
Não me beija a boca.
Vacila na adrenalina do trapezista e
na coragem  do domador.
Fareja esconderijo
em   sinagogas,  mesquitas e  igrejas.
Procura castigo, perdão e razão
nos sete pecados capitais.
Freqüenta terreiros, lugares suspeitos.
Aguarda vento Norte
que  chicoteia o corpo.
A voz que me fala também grita.
Mas eu me calo, para não me desarmonizar.
Não transbordar afeto,
não me fazer infeliz.
Às vezes, nem sabe que existo
porque ando com os pés no chão
para não despertá-la.
Para não reconhecer tons graves
e me perder em harmonias agudas que desconheço os ritmos
podendo, sem querer, virar hinos.
A voz que me fala me vicia.
Compassiva, me silencia.
Esvazia minha sementeira e colhe razões.
A voz que me fala arrepia.
Deseja minha flor, minha sabedoria.
Não rega.
Não fertiliza.
Não ara minha terra.
Não gira meus chacras.
Não me magnetiza.
Apenas deixa-me em transe.
A voz que me fala distancia-me das quimeras.
Não me sussurra.
Não lambe meu sereno.
Não me cobre corpo, nem me vela sono.
A voz que me fala só me faz escutar quando morre,
no silêncio da hora exata,
depois do eco, depois do suspiro, depois do alívio
da minha paixão satisfeita.
Mas o que ela me fala, mesmo na morte,
nem sempre  quero  escutar.
Porque o silêncio é minha voz, sempre.
Na vida.
Na morte.
Em qualquer lugar.